Você que atualmente ocupa um cargo de liderança ou de subordinação certamente já teve ou tem um líder que influenciou sua carreira. Alguém que inspirou sua trajetória profissional e fez você acreditar que líderes carismáticos é que melhor representam o ideal da liderança. Estou certo? Caso concorde comigo continue lendo este artigo que irei desmistificar alguns conceitos pré-concebidos sobre o tema. Caso não concorde com minhas primeiras colocações convido também a continuar a leitura para ver se tenho ou não razão. De qualquer forma quero sua atenção e reflexão sobre o tema, qualquer que seja sua experiência ou opinião a respeito.
Para entendermos o momento atual e contextualizar sobre a necessidade de novas lideranças – carismáticas ou não – transcrevo um trecho do excelente livro “O Espírito do Líder”, de Ken O’Donnell:
“No atual contexto corporativo, estamos ocupados rejeitando tanto as ideias quanto a linguagem de hierarquias inflexíveis, relíquias de um passado mecanicista e taylorista que funcionaram em tempos mais estáveis e passivos. Procuramos outros modelos de administração que permitam àqueles que possuam características e habilidades naturais de liderança desenvolver-se espontaneamente. Ainda vivemos, entretanto, em um período de transição entre o velho e o novo paradigma, algo mais flexível e compatível com o caos da economia, da política e da sociedade do século 21.”
Vivemos um momento incrível, de grandes transformações, inclusive no papel das lideranças. Porém, vamos conceituar liderança e carisma para que possamos trabalhar em um pensamento convergente. De forma simplificada podemos definir liderança como o processo de exercer influência sobre um indivíduo ou um grupo nos esforços para a realização de um objetivo em determinada situação. Veja que esta definição engloba quatro pilares fundamentais onde a liderança se sustenta: poder (influência), pessoas, metas e circunstância. A liderança está diretamente relacionada a capacidade de exercer o poder sobre uma ou várias pessoas, e a influência é a forma mais legítima de expressão de poder, já que ela carrega a ideia do carisma. Quem tem carisma influencia os outros. Porém, vamos continuar analisando os outros dois pilares: metas e circunstâncias (ah, só para reforçar: não há liderança sem pessoas).
Toda liderança pressupõe objetivos, ou seja, onde se quer chegar ou o que se pretende alcançar. O verdadeiro líder é aquele que conduz as pessoas para um determinado fim. Por isso, o propósito é tão importante. Mesmo que este propósito seja, a grosso modo, visto como maligno, ainda assim é um propósito e seu líder conseguirá atrair diversas pessoas que compactuam deste. Um dos casos mais emblemáticos e sistematicamente lembrado é de Adolf Hitler, que conseguiu unir uma Alemanha falida em torno de uma ideia totalitária, mas muito bem vendida por sua eloquência e firmeza na condução destas ideais e, consequentemente, comprada por milhares de cidadãos inebriados pelo lema de uma supremacia ariana.
Assim chegamos ao último pilar que sustenta a liderança que é sua característica situacional. A liderança deve ser encarada como uma competência a ser aprimorada e utilizada em cada circunstância de forma diferente. O verdadeiro líder tem que ser como um camaleão que se adapta a cada situação, seja da equipe, do meio ou do mercado, entretanto, sem perder sua essência e seus valores fundamentais. Liderança é um exercício de flexibilidade, onde aquele que ocupa a posição de líder tem que estar preparado a todo momento para deixar outro ocupar seu lugar quando ele não tiver competência (momentânea ou definitiva) para gerir aquela situação. Parece simples e é, mas há muitas pessoas que na prática não conseguem agir assim, pois estão presas ao cargo, ao título, aos dogmas. O exercício para se libertar desta “prisão” é compreender que ninguém é líder o tempo todo. Que quando se compartilha a liderança a equipe se sente fortalecida. Ao mesmo tempo há que se ter cuidado, pois só se pode compartilhar algo quando os demais estão preparados para isso, mas isso já é assunto para outro artigo.
Enfim, vamos ao carisma. É bem verdade que já fui tratando do tema de forma subliminar. Em vários parágrafos anteriores fiz algumas citações que levam a pensar sobre carisma, porém sem expor diretamente o assunto. Então vamos a ele agora: podemos definir carisma como uma característica de comportamento relacionada a capacidade de encantar (fascinar) outras pessoas de forma espontânea. Carisma está relacionado a forma de pensar e agir e que faz com que os outros sintam simpatia e admiração pela pessoa carismática.
Diante do exposto, sobre liderança e carisma, é que lanço a questão: e quando o líder carismático atrapalha? É possível que você esteja pensando que isso é incoerente, afinal o líder carismático é aquele que tem a equipe em suas mãos. Pode até ser verdade, mas é aí que mora o perigo. O carisma do líder pode ofuscar outras pessoas brilhantes que compõem a equipe e isso gerar disputas internas, muitas vezes silenciosas e minar a moral do grupo. Um líder carismático é capaz de provocar inveja e/ou ciúmes na própria equipe e/ou em outras áreas de uma empresa, por exemplo. O líder carismático pode sentir-se envolvido em sua “magnitude” e deixar-se levar em devaneios rumo ao “estrelato”.
Ok, ok... são apenas suposições. Pode até ser tudo fruto de minha mente maquiavélica. Porém, é importante pensar a respeito, não é? Afinal, somos humanos, imperfeitos, dotados de vaidades e fraquezas que se não forem devidamente criticadas por nós mesmos, corremos o risco de agir conforme este cenário que apresentei. Ou será que é realmente tudo fruto de minha mente maquiavélica?
Para finalizar, deixo mais uma reflexão sobre o assunto: quando o líder começar a ser reconhecido pela equipe como alguém carismático, é o momento de reforçar seus escudos contra a arrogância e o sentimento de autossuficiência. É a hora de vestir a manta da humildade e da generosidade e lembrar que só alcançou este mérito por causa dos demais. Pense nisso!