Muito já se falou sobre a importância de se ter diversidade no meio corporativo. Além de ser algo justo, as empresas multiculturais, com profissionais multidisciplinares, de diferentes gêneros, origem étnica e faixas etárias, são mais criativas, produtivas e consequentemente mais rentáveis. Diversidade é algo correto a ser feito, motiva os empregados e com certeza é bom para os negócios! No entanto, tornar-se uma marca empregadora inclusiva é um desafio que precisa de envolvimento, comprometimento e disponibilidade da alta gestão para que os colaboradores sejam vistos e reconhecidos por seu talento e não por sua etnia, origem, credo, gênero, orientação ou limitação física.
A segregação é uma marca histórica na nossa sociedade e os resquícios dela se refletem até os dias de hoje. Não apenas no Brasil, mas no mundo todo. As desigualdades sociais e as discriminações de todas as espécies certamente são resultados disso e podem ser notadas em todos os ambientes, tanto nas esferas públicas como nas privadas. No meio corporativo, apesar de todo avanço e esforços jurídicos, vieses inconscientes e senso comuns equivocados são colocados em prática, prejudicando as companhias e limitando o acesso e desenvolvimento de profissionais talentosos e de muito potencial.
Não tenho a pretensão de dar aulas de história, antropologia ou criar teorias, mas os convido à reflexão: quantos funcionários afrodescendentes têm na sua empresa? Quantos são líderes? Quantos trabalham no seu andar? No seu departamento? Quantos participam das reuniões? Quantos frequentam os mesmos restaurantes que você? Há quem acredite que racismo não existe e que vivemos numa espécie de democracia racial. Não é o que percebo. A maioria dos profissionais negros no mercado de trabalho está em funções de base ou intermediárias. Não precisamos de dados estatísticos para comprovar o que está ao alcance dos nossos olhos.
A desigualdade está tão arraigada em nossa cultura que a baixa presença de negros nas empresas é vista com normalidade, principalmente nos cargos mais elevados. Na verdade nem é “vista” porque não existe muita preocupação com o tema. Acho importante lembrar que utilizando o e-social conseguimos fazer uma análise profunda sobre a inclusão de afrodescendentes nas empresas. Este diagnóstico nos ajuda a implementar medidas e KPI’s para medir os avanços e promover equidade.
Entendo que muitas vezes, num processo seletivo, são pedidas habilidades e competências que privilegiam quem teve acesso a ensino de qualidade, oportunidade de fazer intercâmbio e conhecer outras culturas. O nosso histórico de desigualdades sociais acaba segregando os profissionais ainda na triagem, no entanto, acredito que seja viável fazer um processo seletivo mais inclusivo e investir em candidatos que tenham talento e potencial de desenvolvimento, mesmo que tenham pequenos gaps. Para promovermos mudanças construtivas precisamos ser mais flexíveis e abertos às diferenças ao invés de manter o foco exclusivamente nos resultados. Para ter mais inclusão e diversidade nas companhias é preciso olhar o potencial e o talento do candidato, além de estar disposto a correr riscos e a oferecer cursos específicos para preencher alguns gaps, como por exemplo a ausência de inglês fluente.
Diversidade e inclusão tornaram-se essenciais para empresas que pretendem se manter atrativas no mercado porque cada vez mais pessoas buscam companhias e marcas que tenham propósito e valores alinhados às suas crenças pessoais. Temos visto nos últimos anos a quantidade de empresas que têm a sua reputação prejudicada por atitudes preconceituosas. O júri das redes sociais é implacável e o resultado para as companhias são desastrosos. Preconceito gera prejuízos incalculáveis e atrela a sua imagem a ele por bastante tempo.
A discriminação racial no meio corporativo, apesar de não verbalizada, dificulta, inibe, constrange e limita. Não me parece muito assertivo manter no meio corporativo critérios que privilegiam apenas uma parte da população. Não há diversidade sem equidade e tão pouco sem apostar no que foge ao padrão construído no passado, afinal de contas estamos no século 21 e já deveríamos ter aprendido muito com os erros dos nossos antepassados.
A exclusão crônica que começou com a escravatura, segue – de certa forma – até hoje como se fosse um “apartheid” velado. Com o avanço da tecnologia na educação, privilegiados têm acesso a tudo do melhor e os menos favorecidos ficam ainda mais distante de uma educação igualitária. Portanto, se focamos exclusivamente na meritocracia jamais teremos resultados educacionais tangíveis.
A inclusão é uma bandeira que carrego com orgulho, me engajo pessoalmente nas questões relacionadas à inserção do negro no mercado de trabalho, ministrando palestras, participando de painéis, dando mentorias, entre outras atividades. Comecei dentro da Bayer, em parceria com o departamento de Recursos Humanos, discutindo critérios para processos seletivos mais inclusivos.
Há pouco mais de um ano, usei uma rede social para compartilhar a minha indignação sobre o fato de um colega não ter podido participar de um processo seletivo por ser negro, a minha intenção era mobilizar apenas a minha rede de contatos, mas fui surpreendido com a repercussão e o alcance da minha publicação. Recebi feedbacks positivos e negativos, e aprendi muito com cada um deles. Não sou e nem quero ser protagonista dessa história, quero contribuir para que as disparidades da nossa sociedade se tornem cada vez menores. Mas me dei conta de que alguns comentários têm mais impacto quando uma pessoa não-negra o faz. Caso contrário é rotulado como “mimimi”. Algumas pessoas me perguntam por que estou me metendo nesse assunto, dizem que como CEO eu deveria estar focado em outras questões, a minha resposta é sempre a mesma: não adianta apenas falar, devemos dar exemplo. CEO’s engajados, junto com a alta gestão, dão uma conotação mais genuína ao tema.
Falo por experiência própria que ser uma marca inclusiva traz retornos bastante positivos. Igualdade e equidade são essenciais para que tenhamos justiça social na prática e não apenas no discurso.
Fico muito feliz por poder abordar esse assunto nesse boletim porque acredito que a FIESP tem um papel importantíssimo na disseminação deste tema, uma vez que reúne indústrias de diversos tipos nacionais e multinacionais e que ainda não estão discutindo essa temática tão importante para o desenvolvimento do nosso capital social.
Theo Van Der Loo é formado em Administração com MBA pela Thunderbird School of Global Management, ex presidente da Bayer Brasil por mais de 7 anos e é sócio-gerente da Nevele Consulting.
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