Constrangido e perplexo, o País vem acompanhando as agressões gratuitas do governo a
autoridades ambientais da Noruega, da Alemanha e da França, agravadas por declarações
sarcásticas e desairosas do presidente sobre a chanceler Angela Merkel.
O acesso de irritação adveio de uma confrontação perfeitamente evitável. Tendo
desdenhado a resistência dos governos da Noruega e da Alemanha a mudanças na gestão
do Fundo Amazônia, bancado pelos dois países, o ministro do Meio Ambiente forçou
uma situação que redundou na suspensão de aportes ao Fundo.
Em vez de um recuo conciliador, o que se viu foi uma escalada de radicalização,
exacerbada por deprimente interação da insensatez do ministro Ricardo Salles com o
primitivismo do presidente. Em audiência na Câmara, em 7/8, o ministro tentou
desqualificar a posição da Noruega com o argumento pueril de que, por caçar baleias e
explorar petróleo no Ártico, o país também teria um passivo ambiental. Poucos dias
depois, o argumento apareceu na boca de Bolsonaro: “A Noruega não é aquela que mata
baleia no Polo Norte? Explora petróleo também lá? Não tem nada a dar exemplo para
nós. Pega a grana e ajude a Angela Merkel a reflorestar a Alemanha.” (Valor, 16/8)
Quando Ricardo Salles foi nomeado ministro, não faltou quem o visse como indicado
pelo agronegócio. Se, de fato, chegou a indicar o ministro, o setor tem boas razões para
estar profundamente arrependido. Acumulam-se evidências de grande apreensão no
agronegócio brasileiro com a rápida deterioração da sua imagem no exterior. A luz
amarela já deu lugar à vermelha. Representantes importantes do setor vêm advertindo
que o governo precisa entender que a agenda ambiental é parte crucial do negócio.
Ricardo Salles ainda não tem uma política ambiental a mostrar. Por enquanto, parece
meramente obcecado com o desmantelamento, a qualquer custo, do “arcabouço
ideológico” do aparato de condução da política ambiental, sem se importar com os efeitos
colaterais que sua truculenta guerra santa vem impondo ao País.
O que há de errado com o ministro aflorou com clareza na sua participação no programa
GloboNews Painel, de Renata Lo Prete, de 10/8. Quem não o viu deveria tentar ver. Os
outros dois convidados eram Ricardo Galvão, ex-diretor do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (Inpe) e Marcelo Brito, presidente da Associação Brasileira de
Agronegócio (ABAG). Como bem mostrou o início do debate, o programa era uma
excelente oportunidade para uma discussão de bom nível sobre a política ambiental.
Mas Ricardo Salles não estava ali para isso. E, afinal, não resistiu. Não teve melhor ideia
do que se prestar a interpelar Ricardo Galvão sobre a forma supostamente desrespeitosa
com que havia se referido ao presidente Bolsonaro, quando por ele duramente atacado.
O que obrigou Galvão a ponderar que, no caso, quem havia sido desrespeitado era ele e
não o presidente. De fato, como amplamente divulgado em 19/7, Bolsonaro havia
declarado que os dados do Inpe eram mentirosos e que seu diretor deveria estar a serviço
de alguma ONG.
Ao virar a mesa dessa forma, Ricardo Salles pode até ter ganho pontos com Bolsonaro,
por tão prestimosa subserviência. Mas mostrou a mão. Deixou claro que seu problema
básico é uma incontrolável e belicosa propensão a radicalizar e conflagrar, que o leva a
atuar como caixa de ressonância do discurso destrambelhado de Bolsonaro sobre a
questão ambiental.
Mundo afora, os lobbies do protecionismo agrícola nos países importadores de
commodities agropecuárias brasileiras festejam a cada dia os desatinos da área ambiental
do governo. A imprensa alemã já clama por sanções às exportações do Brasil.
Sobram razões para que o agronegócio esteja alarmado. Há muito em jogo. É preciso pôr
fim à insensatez, conter os danos e, tão logo quanto possível, tentar restaurar a imagem
do País no exterior. A dúvida é se o agronegócio acredita que a penosa restauração que
se faz necessária poderá ser feita com Ricardo Salles à frente do ministério do Meio
Ambiente.