De perto nínguem é normal


De perto nínguem é normal

“Mas eu também sei ser careta
De perto, ninguém é normal
Às vezes, segue em linha reta
A vida, que é meu bem, meu mal”.

Retirei essa expressão da letra da música Vaca Profana (Caetano Veloso) porque faz sentido e eco com outras como: “só a convivência mostra a essência o resto é aparência” (Thiago de Mello) ou “quer conhecer o caráter de uma pessoa, dê poder a ela” (Abraham Lincoln).

Evidentemente precisaríamos analisar com mais critério a definição do ser “normal”. Para a estatística ser normal é a maior frequência em uma amostragem. Mas, afinal, o que isso significaria? Aquilo que é aceito? O que estamos acostumados a fazer? A maioria?

Mas sendo assim, significa que é o que é certo? Não necessariamente!

Em suma temos que entender com alguma flexibilidade a questão do conceito de normalidade.

Mas meu objetivo é tratar as dificuldades no relacionamento em uma comunidade qualquer, com base no comportamento humano. E quando estamos nos referindo ás comunidades empresariais temos alguns agravantes para a questão do relacionamento. A empresa é o palco do poder e da competição. Esses não são apenas defeitos porque competir com os concorrentes, por exemplo, é altamente positivo, competir para o desenvolvimento pessoal também, mas nem sempre sabemos quando parar ou onde colocar a nossa energia. Por isso quando a competição dirige-se para dentro do ambiente empresarial com o objetivo de sobrepujar o outro, do nosso ambiente, temos então, um problema a mais a administrar.

Mas sem dúvida o título me conduz á conclusão de que todos nós temos as nossas idiossincrasias, diferenças, traumas e algumas vezes podemos proceder de maneira distinta dos nossos objetivos maiores.  Sim, porque não? Afinal não somos perfeitos. Pois é, é completamente normal. Normal?

Sim, mais uma vez de frente com o conceito de normalidade. Mas viver em situações de tensão, conflitos, competições e disputas nos levam a criar defesas e artifícios para esse enfrentamento. Afinal hoje substituímos as armas físicas pelo nosso posicionamento pessoal para nos defender, por vezes esquecendo que a pior das armas pode ser a palavra. Simplesmente.

Para explicar melhor essa situação vou utilizar, mais uma vez, a letra de uma música (Castigo de autoria de Dolores Duran, na década de 50 – ok, sei que Você não conhece, mas a letra vai fazer sentido):

“A gente briga, diz tanta coisa que não quer dizer”.

“Briga pensando que não vai sofrer”. “Que não faz mal se tudo terminar”.

Pois é, às vezes dizemos algumas coisas que não queríamos dizer.

Mas para enfrentar o “palco de disputas”, que é como se configura o nosso caminho por este mundo, devemos, também, entender qual é o “arsenal” de que dispomos, isto é, o que trazemos como conhecimento, formação e, indiscutivelmente, transtornos de personalidade derivado das nossas experiências vividas.

H – Bernardo, o que Você está dizendo é que todos nós temos algum problema de ordem emocional, isto é, somos meio louquinhos? É isso mesmo?

Calma Halter, não é assim, mas é mais ou menos isso. Na realidade todos sofremos fortes pressões de todos os tipos sobre o nosso comportamento, nossa autoestima e nosso equilíbrio emocional. Só para exemplificar se levamos uma “fechada” no transito muitas vezes a nossa reação mais natural é reagir e tentar “devolver” a fechada ou simplesmente xingar o autor.

Em suma estou dizendo que reagimos ás ameaças, ou ao que nos parecem ser ameaças, de maneira absolutamente automática.

Isso não chega a comprometer o posicionamento das pessoas se não houver excessos na reação. Ou seja, há diversos graus de comprometimento nesses desvios de comportamento de forma que, apesar de que cada um de nós apresenta algumas limitações, essa situação não chega a se tornar um problema de consequências mais desastrosas. Mas, sem dúvida, precisamos nos controlar e adotar posturas cada vez mais organizadas e centradas. Em suma, deve haver vigilância.

Jung diz que não se devem ter confrontos nem ficar discutindo sobre questões psicológicas.

Segundo ele, é melhor calar a boca quando estamos prestes a explodir. Isso não quer dizer que devemos acumular emoções, mas também não é interessante permitir que elas envenenem o relacionamento.

A catarse, ou seja, “por tudo para fora”, é uma técnica que nem sempre é eficaz, pois não sabemos que lado nosso está falando, se são nossos sentimentos que querem ser externados ou nossos complexos. Aqui cabe uma observação interessante sobre os complexos.

Nós não temos complexos, eles nos têm! Isso quer dizer que, com frequência, são os complexos que controlam os nossos comportamentos. Nestas questões prevalece o mecanismo reflexo, fundamentadas por situações de experiências passadas que estão CONSTELADAS, isto é, reforçadas por percepções estabelecidas e definidas anteriormente, inclusive e principalmente nas relações familiares e que se mantém indefinidamente interferindo fortemente em nossos posicionamentos.

E as forças dos complexos atuam de forma cíclica e, frequentemente é provocada por estímulos externos, normalmente relacionados á fatores de relacionamento. Um complexo com o pai pode ser estimulado por uma pessoa (ou por uma ação) que simboliza um pai ou evoca memórias.

Vários autores reforçam essa postura.

Nossos contrassensos são interessantes. Por exemplo, em uma afirmação de Freud: “Nós poderíamos ser muito melhores se não quiséssemos ser tão bons”.

Jung contribui com: Tudo que nos irrita nos outros pode levar-nos a um entendimento de nós mesmos” e complementa: “Tudo depende de como vemos as coisas e não de como elas são”.

Nesta medida ressaltamos a questão da Percepção, que Ronald Laing (psiquiatra famoso no estudo da percepção) reflete com muita propriedade: “Você não é o que pensa ou pretende ser, mas o que os demais percebem.”, revelando a diferença entre a auto e a hetero percepção.

Mas, afinal, queremos o que queremos ou estamos apenas tentando dar uma resposta para nosso passado? Então admito, há muita pressão sobre o nosso posicionamento. Sofremos influências diversas e nos cabe exercer a perpétua vigilância porque vivemos no limiar da nossa vontade com a influência das nossas experiências passadas e atuais . Considerando-se minhas convicções religiosas poderia repetir um refrão inquestionável e, sem dúvida, difícil também: Orai e vigiai!

Uma influência muito consistente em nossos posicionamentos tem origem em nossos traumas de infância. Não é pequena a porcentagem da ocorrência de traumas de infância que nos condicionam comportamentos e por motivos mais diversos possíveis.

Nossa educação e ambiente familiar são fundamentais para influenciar o futuro. A força do ambiente e, talvez possa até afirmar, a influência da figura do pai é de enorme força no desenvolvimento do posicionamento futuro. A mãe, normalmente, mantém maior presença e influência no desenvolvimento, mas a aprovação é, frequentemente, esperada do pai.

O passado nos condiciona posicionamentos para o futuro. Em algumas pesquisas sobre empreendedorismo identificamos um fator de forte influência na busca por criação de negócios e desenvolvimentos. Esse fator é: infância pobre!

Em suma, somos fruto de várias influências que nos posicionam de maneira controvertida com a realidade.

Costumo dizer que um dos causadores de problemas no relacionamento é o Sucesso. Sim, quando é dos outros. Sucesso bom é o nosso! Sucesso dos outros é, ás vezes, até humilhante.

Então é inevitável transitar com fatores de traumas de infância, distúrbios diversos de personalidades característicos das pressões e dos ambientes em que vivemos e nossas necessidades de ego. A vaidade é, muitas vezes, uma necessidade de compensação. Então, ser normal é ter algum problema, sem dúvida. Só precisamos controlar a dose.

H – Ah, então é como afirmei. Somos meio um pouco louquinhos.

Pois é Halter, de certa forma sim.

Mas são essas imperfeições que nos transformam em maravilhosos seres humanos em desenvolvimento. Perfeição não desafia. É muito chata!




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