O casamento na Índia é uma das principais festas familiares. Os pais da noiva se preparam financeiramente para bancar boa parte da festa de casamento. Uma forma de dote moderno, embora, cada vez mais, as despesas sejam divididas entre os dois lados. O nosso guia em Jaipur, após visitarmos o palácio do rei da região e ver o salão de festas do local, nos fez sentar para nos mostrar a festa de casamento da filha dele, ocorrida no ano passado: “festa de casamento como de um maharana (tipo de rei na Índia)”, nos disse, todo orgulhoso. Imagino que, para o pai de uma menina, numa sociedade tão preocupada com a convivência social, seja realmente importante mostrar que pode pagar uma linda e longa festa. Foram 4 dias de festa!
As mulheres se casam de vermelho (pelo menos nas regiões que visitamos: Agra, Delhi, Jaipur, Udaipur e Varanasi). A cor é um código social que diz para todos que ela está indo se casar ou acabou de se casar (só por curiosidade, o branco aqui significa luto). Vimos ao longo das cidades que passamos diversas casas de festa específicas para casamentos. Todas decoradas parecendo os salões de baile no Carnaval carioca. Cheias de brilho, cores e luzes. Os carros que trazem os noivos são ostensivamente decorados com flores. Nem sei como conseguem dirigir com tanta flor pendurada ao longo do vidro do para-brisa. Bom, dirigir na Índia é outro assunto que vale um texto exclusivo.
No nosso voo de Varanasi para Delhi, encontramos um casal que acabara de se casar. Na entrada do aeroporto, a noiva se despediu do pai passando as duas mãos sobre o braço dele, se abaixando e beijando-lhe a mão. Repetiu tudo com o outro braço e mão. Depois partiu com seu sorridente e orgulhoso marido para dentro do aeroporto (por segurança, só entram passageiros dentro do aeroporto). A partir daquele momento, sua sorte estava na mão de outro homem. Do pai passou para o marido.
Na populosa Índia, a grande maioria segue as antigas tradições. As jovens mulheres se casam e vão morar com a família do marido. A mulher só assume algum poder quando vira mãe. Segundo a tradição indiana, o homem deve respeito à mãe acima de tudo – ou quase tudo. Assim, a nora fica sob o comando da sogra. Como elas casam muito cedo, fico pensando como devem se sentir ao sair da casa dos pais e ir parar numa casa que talvez mal conheçam. Obedecendo ao marido e, acima de tudo, à sogra.
Aprendi a ler as situações dentro de seu contexto histórico. As mulheres foram criadas nessa lógica. Talvez, pela própria ignorância, acreditem que só exista essa forma de viver. Talvez sejam felizes assim. A noiva que, por coincidência, estava no nosso voo para Delhi se apresentava feliz. E tímida. Mesmo assim, provavelmente estava preparada para viver em outra cidade, longe da família.
Quando chegamos a Delhi, meu marido e eu, propositalmente, ficamos ao lado deles na esteira para esperar as malas. Puxamos conversa com os dois, embora ela não abrisse a boca – talvez por não falar inglês. Ele estava muito feliz. Muito mesmo. Bonito de ver o entusiasmo nos olhos dele. Tinha pintado a mão com hena como ela. Estava feliz por ter feito o casamento deles à moda tradicional. Acredita ser importante manter as tradições e deseja poder passar isso para seus filhos. O que, claro, já sabe, será um desafio.
Elogiamos a beleza dos dois e reparamos no ouro que ela carregava. Parte do dote que ela leva consigo. Também reparamos que somente nós dois estávamos fascinados por eles. Para o indiano comum, ver uma mulher vestida assim faz parte do dia a dia. Em um país com 1,3 bilhão de habitantes, há muitos casamentos por dia. Reparei também que ela me olhava com tanta curiosidade e admiração como eu a ela. O que será que ela pensava sobre mim? Quão distante e estranha, poderia parecer?
Ao nos despedir, desejamos de todo o coração que eles fossem muito felizes. Desejamos vida longa e próspera. Eu, no meu íntimo, desejei que a sogra dela fosse legal e que o marido fosse um bom homem.Na Índia, muitas mulheresabandonam os estudos e param de trabalhar em empregos externos quando os filhos chegam. Sem dinheiro próprio e sem estudos, ficam à mercê do marido e da família dele.