A crise da ecologia psíquica.


A crise da ecologia psíquica.

O mundo moderno nasceu embalado por três ilusões poderosas:

I) a de que o progresso da ciência permitiria banir o mistério do mundo e elucidar o sentido da existência;

II) a de que o projeto de explorar e submeter a natureza ao controle da tecnologia poderia prosseguir indefinidamente sem atiçar a ameaça de grave descontrole da biosfera;

III) a de que o processo civilizatório promoveria o aprimoramento ético e intelectual da humanidade, tornando nossas vidas mais felizes, plenas e dignas de serem vividas.

O moderno Ocidente trouxe fabulosas conquistas, mas as suas promessas não se cumpriram. Se é verdade que uma era termina quando suas ilusões fundadoras estão exauridas, então o veredicto é claro: a era moderna caducou.

Na encruzilhada do século 21 , como enuncia com lapidar clareza a encíclica Laudato si' do papa Francisco, “os desertos externos estão aumentando no mundo porque os desertos internos se tornaram tão vastos".

A degradação do mundo natural que nos cerca tem um correlato em nosso mundo interno. Assim como o metabolismo entre sociedade e natureza no mundo moderno produziu a crise ambiental, de igual modo a nossa natureza interna vem sofrendo as consequências inadvertidas e indesejadas de um processo civilizatório em guerra com o psiquismo arcaico do animal humano e calcado no culto fanatizado da tecnologia e da máxima eficiência em tudo.

A crise da ecologia psíquica é fruto da severidade da renúncia instintual imposta por um processo civilizatório agressivamente calculista e cerebral: uma forma de vida em que a convenção e a hipocrisia permeiam os vínculos erótico-afetivos enquanto a competição feroz, a ansiedade e a ambição irrestrita dominam o mundo da produção e do consumo.

Daí o fardo do viver civilizado. O ideal de vida da leveza e da “civilização sem peso", como propõe Gilles Lipovetsky, pressupõe a conquista de uma relação menos hostil e arrogante não só com a natureza externa, mas com a natureza interna ao ser humano.

E o Brasil com isso? Será desvairadamente utópico imaginar que temos tudo para não capitular à opressiva industriosidade geradora de objetos demais e alegria de menos do tecnoconsumismo ocidental? Que o Brasil, embora modesto nos meios, mantém viva sua aptidão para a arte da vida e a capacidade de cultivá-la a uma perfeição mais plena? Que podemos ousar modelos de economia e convivência mais humanos e adequados ao que somos e sonhamos?


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