O presidente Bolsonaro anunciou ontem, via redes sociais, seu apoio à proposta de venda direta de etanol aos postos de combustíveis, ora sob exame no Congresso. Seria revogada, em consequência, a resolução da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que veda esse tipo de transação.
Aparentemente, faz sentido. Hoje, usinas e destilarias próximas aos postos transportam o etanol para centros de distribuição mais distantes. O livre comércio aumentaria a concorrência entre o produtor de etanol e o distribuidor, acarretando queda de preços ao consumidor final. Além disso, poderia gerar fluxos logísticos mais racionais.
Na verdade, essas vantagens são em muito superadas pelas desvantagens. O etanol é vendido em mais de 40 mil postos Brasil afora. Dificilmente seus produtores conseguiriam suprir todos os postos com logística mais eficiente do que a dos distribuidores. A proximidade produtor/posto acontece em reduzidíssimos casos, insuficientes para justificar uma mudança dessa magnitude.
Cerca de 20% do etanol são entregues por meio de dutos, ferrovias e navegação de cabotagem. Essa proporção tende a aumentar com os investimentos que vão ocorrer na infraestrutura de transportes. Os produtores não teriam como recorrer a esses modais na mesma dimensão dos distribuidores. A venda direta pioraria, pois, ao contrário que parece, a operação da logística e aumentaria o tráfego de caminhões nas já deficientes estradas do país.
A produção de etanol ocorre em apenas parte do ano. Os distribuidores o armazenam para permitir a entrega em todo o país e garantir o abastecimento durante todos os meses. Isso dificilmente poderia ser feito pelos produtores.
O distribuidor tem incentivos para controlar a qualidade do produto, pois precisa zelar por sua imagem. O distribuidor recebe o produto de várias procedências e o “harmoniza”, permitindo sempre melhor qualidade e rastreabilidade.
Em resumo, a venda direta do etanol pode piorar a logística de distribuição e aumentar o tráfego de caminhões nas estradas. Adicionalmente, pode aumentar o potencial de sonegação fiscal, A perda de eficiência implicaria elevação de custos, ao contrário do que disse Bolsonaro, para quem a mudança poderá reduzir pelo menos vinte centavos o litro do etanol.
O presidente parece ter-se impressionado com a informação sobre o “passeio de caminhões” que transportam o etanol, mas essa é apenas uma parte da história. O modelo atual foi estabelecido pela ANP depois de longa discussão, que envolveu produtores, distribuidores e distintos órgãos do governo. O presidente faria bem se ouvisse os órgãos técnicos do governo antes de mover-se por impulso e apoiar mudanças que não consideram todas as circunstâncias.
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